União
gastará R$ 3,8 bi com pagamento de pensões vitalícias a filhas de militares
Há 185.326 beneficiárias na Marinha, no Exército e na Aeronáutica, que
equivalem a 27,7% do total de pensionistas
Benefícios
vitalícios, caros aos cofres da União e que vão durar até o fim do século. Esse
é o caso de pensões a filhas de militares e servidores civis, privilégios que
permanecem intocados em um país que enfrenta uma crise econômica aguda. Segundo
dados do Ministério da Defesa enviados à Comissão de Orçamento, há 185.326
beneficiárias nas três Forças — Marinha, Exército e Aeronáutica —, que
equivalem a 27,7% do total de pensionistas e 36,25% do efetivo de militares. O
gasto estimado com essas pensões em 2015 chega a R$ 3,8 bilhões, num regime de
aposentadoria deficitário e que tem rombo projetado de R$ 11 bilhões para este
ano. De acordo com o documento “Avaliação Atuarial das Pensões dos Militares”,
o resultado negativo vai perdurar por 75 anos.
O benefício da pensão vitalícia para filhas de militares
foi extinto em 2000 para servidores admitidos a partir daquela data, mas quem
já integrava o quadro das Forças Armadas pode optar pelo pagamento de um
adicional de 1,5% na contribuição previdenciária para manter o privilégio.
Assim, o regime será deficitário até 2080. O déficit deverá chegar naquele ano
a cerca de R$ 7,5 bilhões, estima o governo.
As pensões no regime geral de Previdência Social também
são vantajosas. O Brasil é um dos poucos países onde a pensão ao herdeiro é
integral (igual ao valor recebido pelo segurado quando vivo). No ajuste fiscal
do começo do ano, o ministro da Fazenda, Joaquim Levy, tentou mudar a fórmula
de cálculo — o valor cairia pela metade, mais 10% por dependente, incluindo o
viúvo ou viúva. No entanto, o próprio relator da medida provisória, deputado
Carlos Zarattini (PT-SP), mudou o texto proposto pelo governo e reduziu a
economia prevista.
— O governo tem que parar de desfazer com a mão esquerda,
de noite, o que ele faz com a mão direita de dia. O problema do ministro da
Fazenda é que ele está dormindo com o inimigo — disse o economista Fábio
Giambiagi, referindo-se à atitude do relator, deputado da base aliada.
Os cofres estaduais também desembolsam vultosas quantias
para herdeiras de funcionários públicos civis e militares. Até dezembro de
1992, quando o benefício às filhas de civis deixou de ser pago, bastava que a
mulher fosse maior de idade e não se casasse para ter direito a receber. Hoje,
em São Paulo, constam na folha de pagamento da São Paulo Previdência (Spprev)
17.690 pensionistas civis e 10.780 pensionistas militares recebendo o benefício
enquanto se mantiverem solteiras. Só em 2014, foram gastos R$ 784,5 milhões com
esses pagamentos, sendo R$ 416,5 milhões a herdeiras de civis, e R$ 368 milhões
a herdeiras de militares.
Já a Previdência do Estado do Rio gasta, todo ano, R$ 740
milhões com benefícios a filhas solteiras de funcionários públicos, também
incluindo civis e militares. Hoje, há 25.290 beneficiárias recebendo pelo
Rioprevidência. Uma auditoria feita pelo estado identificou que 3.381
pensionistas recebiam dinheiro irregular — eram casadas ou viviam em união
estável. Quando foram comunicadas, 350 pediram a suspensão do benefício. As
demais foram suspensas por processo administrativo. Segundo o Rioprevidência, a
auditoria gerou economia anual de R$ 350 milhões.
O benefício social (Lei Orgânica da Assistência Social,
pago a idosos e deficientes da baixa renda, que nunca contribuíram) na área
rural também é diferenciado. Na zona urbana, o benefício acaba com a morte do
beneficiário, ou seja, não gera pensão. Já na área rural, gera pagamento de
pensão — há cerca de cinco milhões de moradores no campo e 8,4 milhões de
pessoas recebendo dois benefícios (aposentadoria e pensão, equivalente a dois
salários mínimos).
Outro auxílio polêmico — e caro aos estados — é o
pagamento de pensão a ex-governadores e ex-primeiras-damas. Em abril deste ano,
o Supremo Tribunal Federal (STF) concedeu liminar suspendendo a pensão
vitalícia a ex-mandatários do Pará. Como O GLOBO revelou no ano passado,
ex-governadores e ex-primeiras-damas recebem aposentadorias especiais e pensões
vitalícias que variam de R$ 10,5 mil a R$ 26,5 mil, a um custo anual de R$ 46,8
milhões.
Nas assembleias legislativas, também há exemplos de
benefícios salgados para os cofres estaduais. Na Assembleia Legislativa do Rio
(Alerj), por exemplo, cada um dos 70 deputados tem direito a um cartão
combustível mensal para uso nos carros oficiais, no valor de R$ 2.970. O custo anual
chega a R$ 2,4 milhões.
No Judiciário, apesar da luta dos servidores por
reajustes, muitos salários são de marajás, já que o teto institucional, fixado
em R$ 33,7 mil, é muitas vezes ultrapassado. Gratificações e adicionais não
entram no cálculo. Segundo relatório Justiça em Números, do Conselho Nacional
de Justiça (CNJ), esses dois itens representaram, ano passado, R$ 3,8 bilhões
das despesas do Poder Judiciário, equivalente a 6,3% do total gasto em 2014. Um
dos casos mais emblemáticos é o do Tribunal de Justiça de São Paulo. Dos 128
desembargadores e juízes, 42 recebem salário líquido acima de R$ 50 mil — 32,8%
do total de magistrados. O maior rendimento chega a R$ 70,5 mil. Apenas dois
estão dentro do teto.
AUXÍLIO-EDUCAÇÃO PARA ATÉ TRÊS FILHOS
No Tribunal de Justiça do Rio, entrou em vigor, em agosto
deste ano, o auxílio-educação para até três filhos de magistrados e servidores,
no valor de R$ 953,47 por filho. O tribunal também reembolsou o retroativo aos
meses de junho e julho. Até agora, o custo do auxílio foi de R$ 11,4 milhões,
um adicional de R$ 3,8 milhões por mês. O benefício já está sendo usado por
5.092 pessoas, sendo 5.081 filhos de magistrados e servidores e 11 magistrados,
que têm direito ao benefício enquanto cursarem pós-graduação. O salário bruto
de um desembargador é de R$ 30,4 mil.
Para Giambiagi, a União não pode mais arcar com esses gastos:
— Vai ser difícil continuar levando o país sem fazer
reformas. Nos últimos 12 anos, só tocamos o barco. Agora, corremos o risco de
caminhar para uma situação fiscalmente dramática.
Outra mordomia dada no Judiciário é o auxílio-celular.
Somando os custos com o benefício no Tribunal de Contas da União (TCU), no
Tribunal Regional do Trabalho da 1ª Região (TRT-RJ) e no Tribunal Regional
Eleitoral do Rio (TRE-RJ), o custo é de R$ 1,3 milhão por ano. Só no TCU, os
gastos chegam a quase R$ 1 milhão por ano, ou R$ 82,3 mil por mês. Têm direito
ao benefício 104 servidores e 19 autoridades, com cifras variáveis de acordo
com o cargo: vão de R$ 465,03 a R$ 1.395,10 por mês. O maior salário do
tribunal, sem benefícios, é de R$ 23,8 mil.
No Rio, o Tribunal Regional do Trabalho da 1ª Região
(TRT) disponibilizou 107 aparelhos de celular para magistrados. Além disso, o
tribunal arca com gastos mensais de até R$ 200. O custo anual do benefício
chega a R$ 256,8 mil. Os magistrados, que já têm direito a inúmeros outros
benefícios, quiseram mais: juízes do Trabalho entraram com uma liminar para
acumular dois auxílios-moradia no caso de magistrados casados. A Procuradoria
estadual tentou suspender a liminar, mas não obteve sucesso.
Consultor da Comissão de Orçamento da Câmara, Leonardo Rolim
destaca que a manutenção desses privilégios custa caro ao país:
— Quem paga a conta é toda a sociedade, o desempregado,
as pessoas de menor renda.
— Em algum momento, é preciso acabar ou pelos menos
reduzir esses privilégios, que eu prefiro chamar de diferenças — reforçou o
pesquisador do Ipea Marcelo Caetano.
O ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva tentou, no
início do mandato, fazer mudanças no regime dos militares, mas acabou recuando,
diante da forte resistência da classe.
O Ministério da Defesa alegou que os militares são uma
categoria diferenciada e que o regime de aposentadoria deve ser analisado de
acordo com normas específicas. Informou ainda que as regras para a classe são
diferentes não só no Brasil, mas em vários países.
Fonte:
http://jornaldehoje.com.br/
Nenhum comentário:
Postar um comentário